Augusto de Franco, nesta obra, aglomera os dez textos mais comentados em seu site Escola de Redes. Os temas versam sobre poder nas redes, modelos mentais, individualismo, independência, redes empresariais entre outros. No recorte aqui apresentado, o foco são os quatro primeiros capítulos.
No primeiro capítulo, o autor aborda o tema poder nas redes sociais, para quem, já por definição, poder é um fenômeno próprio das estruturas que possuem padrão centralizado, hierarquizado. As estruturas em rede possuem poder compartilhado, distribuído.
Porém, o poder nas redes sociais (quando existe) pode ser visto como a possibilidade de algum de seus nós (ou atores) obstruir fluxos (ou filtrar) da informação, separar (criar clusters), e excluir ou desconectar atores.
Uma vez que, como defende o autor, redes são movimentos em um campo de fluições, de um ponto de vista político, elas são movimentos de desconstituição de hierarquia., pois indica a multiplicidade de caminhos e, desta forma, poder é uma medida de não-rede.
De uma forma errônea, a sociologia encara as redes como uma metáfora para organizações sociais (grupos de indivíduos), possibilitando maneiras de apresentar, visualizar e investigar a relação entre esses indivíduos. Essa interpretação, junto a outras tantas (tão falhas quanto) culmina no erro maior que é a confusão entre os termos poder e influência.
Reforçando, poder nas redes sociais é uma questão de centralização. Rede centalizada é aquela que configura o padrão um-com-todos, enquanto a distribuída é aquela que configura o padrão todos-com-todos.
Porém, a partir de um certo momento, de um certo número de nodos (atores), nenhuma rede social real consegue ser totalmente centralizada, pois o próprio tamanho (social) do mundo impõe um número mínimo de conexões entre quaisquer nodos escolhidos aleatoriamente.
Uma das principais vantagens da rede é o empoderamento (criar poder) de seus participantes, o que é o contrário de apoderamento (tomar posse). Assim, alguém tem mais poder por três motivos: (i) entronca mais conexões; (ii) estabelece novos fluxos para o futuro; (iii) aumenta seus graus de empatia por compartilhamento com os demais.
O tema do segundo capítulo são os modelos mentais, em que o autor parte do pressuposto de que a mente não é a cabeça, envolve todo o ser humano, sendo um continuum de experiências individuais intransferíveis, um entroncamento de fluxos que o ligam aos outros seres humanos com os quais se relaciona. Desta forma, a mente é uma nuvem, tal qual nos modelos da cloud computing.
Para o autor, somos programados por memes (unidades auto-replicadoras, análogas aos gene), conceito usado para explicar o porquê da repetição de padrões de comportamento ao longo da história e em locais distintos.
Porém, como se vive em rede, que é um sistema complexo, a forma e o comportamento cultural se manifestam como propriedades que emergem da dinâmica da rede e não pela alteração casual dos “memes”.
Assim, ao unir os conceitos de “meme” e rede social, o autor coloca que cada elemento no mundo (ator ou nodo na rede) “influi no mundo a partir da afirmação da sua própria maneira de ser/estar/receber-processar-desenvolver estímulos/interagir em suma, e quanto mais essa maneira puder ser copiada […] por outros nodos, maior será a capacidade desse elemento de influir no comportamento dos outros elementos do mundo” (p. 32).
Outra ideia acerca da proliferação dos “memes” é o efeito de polinização (ou cacho), em que uma ideia é o resultao do trabalho de uma comunidade intelectual, a partir do momento em que cada um de seus membros reconhece que o seu trabalho está sendo descrito e desenvolvido não mais individualmente, mas por outros colegas.
Uma terceira linha de pensamento, as ideias parecem estar no ar e alguém as capta em certo momento e, às vezes, várias pessoas as captam simultaneamente.
O resultado é que o mundo das ideias é pequeno (concentrado, com alta “tramatura social”) e é por isso que elas crescem em cachos em tais comunidades e saltam delas para o ambiente exterior com mais facilidade.
Para as organizações, compreender e aceitar a possibilidade da estrutura em rede é um processo de aprendizagem mais árduo do que para o indivíduo, mesmo que algumas já estejam iniciando sua adoção. É sobre este tema que versa o terceiro capítulo.
Um ambiente organizacional favorável à cooperação é aquele cuja topologia é mais distribuída do que centralizada. Esse fenômeno se manifesta em função dos graus de distribuição e conectividade da rede social em que o indivíduo está inserido, sendo que, quanto mais densa e distribuída for a rede, maior sua capacidade de converter competição em cooperação.
A principal dificuldade de aceitar o padrão de rede é função da forma como nos organizamos e não da nossa falta de capacidade de entendimento do assunto, sendo preciso alterar a programação, o “meme” dos agentes empresariais, levando-os a perceber que esta mudança tem a ver com a capacidade de a empresa se adaptar rapidamente às mudanças intempestivas do meio em que estão inseridas, uma questão de sustentabilidade.
Uma vez que os agentes empresariais estão lotados em posições dentro de estruturas verticais de comando-e-controle, onde se destacam dos demais, será difícil romper este modelo para um mais horizontalizado. Essas organizações (e seus agentes) aceitam facilmente novos modismos, linguagem, metodologias, metafísicas, mas querem continuar como estão. Tudo é aceitável, desde que não mexam no meu lugar.
Se para as organizações é difícil aplicar a estrutura em rede, apesar de diversas redes informais intra e inter-organizacionais existam, a visão das cidades sobre o assunto não é diferente. A independência das cidades e a aplicação do padrão/pensamento em redes nas cidades e abordado no quarto capítulo, uma vez que moramos, estudados, trabalhamos e nos divertimos em cidades.
Sabe-se que, em qualquer setor, quanto mais independentes de instâncias de “cima” e de “forma” forem as cidades (e as organizações), menos vulneráveis elas serão ao contágio das crises globais. Porém, no atual modelo (federativo) , as cidades são realmente subordinadas a um poder superior, tendo seu funcionamento dependente de decisões tomadas sem a sua participação, o que não gera interdependência.
Para romper com essa hierarquização do poder, essa subordinação ao poder estatal, o autor sugere a independência das cidades dos Estados-nação, pois este tornou-se não só pequeno demais para resolver os grandes problemas, mas grande demais para resolver os pequenos.
A partir do entendimento de que cidades são como redes de múltiplas comunidades interdependentes e não da réplica Estatal montada nas cidades, percebe-se que se está diante de mudanças sociais mais profundas, que dizem respeito aos padrões de vida e de convivência social e não apenas diante de alterações na estrutura e na dinâmica do capital e do capitalismo.
É preciso perceber que “são os fenômenos que ocorrem na intimidade da sociedade e que têm a ver com o grau de conectividade e distribuição da rede social que acarretam a estrutura e a dinâmica dos novos agrupamentos humanos que se estabelecem sobre o território e, inclusive, daqueles que não estão estabelecidos sobre um território” (p. 58).
Apesar dos diversos empecilhos, a independência das cidades não será conquistada por golpe ou em afronta às leis e a institucionalidade dos países. Será um processo lento, através de movimentos sociais, alterações na sociedade e na forma em que ela controla os governos (governança), a emergência da cidadania, na inovação dos modelos.
Nestas “novas” cidades e, por consequência, nestas “novas” sociedades em rede, será difícil a construção de monopólios de um fator cada vez mais decisivo nos processos de produção e regulação: o conhecimento, um bem intangível que se for compartilhado, cresce, gera novos conhecimentos e aumenta de valor.
Para que as cidades se tornem independentes e adotem a estrutura em rede, elas precisam, ainda, adotar quatro comportamentos:
- Cidade aberta e conectada: eliminar as proteções aos de dentro e as barreiras aos de fora, possibilitar aos seus habitantes e organizações se associarem a empreendedores e empreendimentos de outros lugares;
- Cidade ágil na regulamentação: simplificar as leis e regulamentos;
- Cidade educadora: cidades que não abandonam seus habitantes nas mãos dos deformantes aparelhos de ensino escolares e acadêmicos, mas possuam seus próprios mecanismos sociais de incentivo ao autodidatismo, ao homeschooling e ao communityschooling e às novas redes de aprendizagem em todos os níveis;
- Cidades com novos sistemas locais de governança: condição necessária para desamarrar as forças criativas e empreendedoras que estão latentes nas cidades.
Para que se viva em rede, será preciso/necessário reorganizar em rede tudo o que for possível (e quase tudo é possível).
Dúvidas ou sugestões, entre em contato.
Referência
DE FRANCO, Augusto. 10 escritos sobre redes sociais, 2009. Disponível em <http://www.slideshare.net/augustodefranco/2009-10-escritos-sobre-redes-sociais>. Caps. 1, 2, 3 e 4, p. 11-72.
Resumo confeccionado durante o programa de mestrado da UDESC/ESAG
Disciplina: Estudos Organizacionais
Professor: Dr. Mauricio C. Serafim