Este resumo trata dos capítulos 1, 2 e 6 da obra A nova ciência das organizações de Alberto Guerreiro Ramos, sociólogo e político brasileiro.
No primeiro capítulo do recorte, o autor expõe a concepção filosófica (epistemológica) do estudo das organizações a partir dos paradigmas modernos. Baseados em racionalidade instrumental, no sucesso tecnológico, no cálculo utilitário de consequências (interesses), deixando de lado os aspectos subjetivos do ser (valores), a racionalidade substantiva.
Isso se deu pela “necessidade” percebida pelos pensadores do modernismo em romper com os pensadores e filósofos das eras clássica e média, tidos como retóricos e não práticos, sendo este movimento fortalecido nos séculos XVIII e XIX, com o advento das Revoluções Industriais e da economia de mercado, entre outros fatores.
Todo este movimento levou o indivíduo moderno a perder a capacidade de usar a linguagem para transmitir significações. Uma passagem que ilustra esse fato são as palavras de Habermas sobre Marx. Este presumia que “a liberdade e a racionalidade seriam resultados inevitáveis do desenvolvimento das forças de produção”, porém aquele contesta sob o argumento que “o crescimento das forças de produção não significa o mesmo que a intenção da boa vida” (p. 12). O autor faz fechamento dizendo que “o fato é que, nas sociedades industriais, a lógica da racionalidade instrumental, que amplia o controle da natureza, ou seja, o desenvolvimento das forças produtoras, se tornou a lógica da vida humana em geral. Mesmo a subjetividade privada do indivíduo caiu prisioneira da racionalidade instrumental” (RAMOS, 1989, p. 12-13).
Os estudos organizacionais, ao abordar o relacionamento empresa-indivíduo sob esta ótica “dá um cunho normativo geral ao desenho implícito na racionalidade funcional [… sendo] portanto, teoricamente, incapaz de oferecer diretrizes para a criação de espaços sociais em que os indivíduos possam participar de relações interpessoais verdadeiramente autogratificantes [… pois] a psique humana deve ser considerada o ponto de referência para a ordenação da vida social, tanto quanto para a conceituação da ciência social em geral” (p. 23).
No segundo capítulo, o autor reforça as diferenças entre as correntes de pensamento (substantivo x instrumental), mostrando, principalmente, as mazelas de considerar o homem nada mais que um ser social, a partir de uma visão sociomórfica, tornando-se alvo das necessidades socialmente induzidas, contra as quais já alertava Santo Tomás de Aquino que já dividia as necessidades em naturais (bebida, comida) e artificiais (dinheiro).
Com a explosão da Revolução Industrial, a prosperidade material passou a ser tida como possível para todos, tornando a riqueza uma meta fundamental ao sistema, que sustentou as teorias políticas desde então, o que transformou o padrão ético do substantivo pela justificação moral do interesse imediato do indivíduo, fazendo-o se esforçar “para elevar ao máximo os seus ganhos” (p. 37), tornando-se mera força de produção, que aceita a sociedade centrada no mercado, sem conceito de valores, exclusivamente interessada em fatos.
Para romper com esse modelo, na visão do autor, é imprescindível a ruptura com a ideologia social do Ocidente, o que não acontecerá a menos que “os povos sejam ativados para construir imediatamente, partindo daquilo que já têm, uma sociedade racional, entendida em termos substantivos e despojada das atuais conotações serialistas e futuristas” (p. 41), uma “mudança no íntimo das pessoas, em sua orientação relativamente à realidade e nos critérios de percepção e definição de suas necessidades e desejos” (p. 42).
Ao final do capítulo, o autor lembra que “é a razão, em sentido substantivo, que capacita os seres humanos a compreenderem as variedades históricas na condição humana” (p. 46).
No último capítulo analisado, o autor visa criar uma análise organizacional a partir dos preceitos da racionalidade substantiva, a partir de duas tarefas distintas: (a) o desenvolvimento de uma análise capaz de identificar os ingredientes epistemológicos dos diversos cenários organizacionais e (b) o desenvolvimento de um tipo de análise organizacional sem os padrões distorcidos de linguagem e conceptualização.
Sobre o primeiro ponto, o autor destaca a questão de a empresa estar mudando o ambiente em que está inserida, ao invés de ao contrário, como era dado por certo na literatura e, mais adiante, cita Donald Schon, para quem qualquer sistema social é composto por três elementos:
- Estrutura: (conjunto de papéis e de relações entre os membros;
- Tecnologia: conjunto vigente de normas e praxes consolidadas, através do qual as coisas são feitas e os resultados obtidos; e
- Teoria: o conjunto de regras epistemológicas segundo o qual a realidade interna e externa é interpretada e tratada, em termos práticos.
No segundo tema, o autor se aprofunda mais, iniciando a análise pela identificação dos principais pontos cegos da atual teoria das organizações, que são:
- O conceito de racionalidade predominante na vigente teoria organizacional;
- A não distinção sistemática entre o significado substantivo e formal da organização;
- A falta da compreensão clara do papel da interação simbólica no conjunto dos relacionamentos interpessoais;
- O apoio da presente teoria da organização em uma visão mecanomórfica da atividade produtiva do homem.
Após a análise dos pontos cegos, o autor, então, expõe que, para a criação de uma abordagem substantiva das organizações, seria necessário um enfoque caracterizado pelas seguintes considerações:
- Os limites da organização deveriam coincidir com seus objetivos;
- A conduta individual está subordinada a compulsões operacionais formais e impostas, o que torna o comportamento administrativo incompatível com o pleno desenvolvimento das potencialidades humanas;
- A organização econômica é apenas um caso particular de diversos tipos de sistemas microssociais, em que as funções econômicas são desempenhadas de acordo com diferentes escalas de prioridades;
- Uma abordagem substantiva da teoria organizacional preocupa-se com os meios de eliminação de compulsões desnecessárias agindo sobre as atividades humanas nas organizações econômicas e nos sistemas sociais em geral;
- As situações em que os seres humanos se defrontam com tópicos relativos à própria atualização adequadamente entendidas, têm exigências sistêmicas diferentes daquelas que atendem aos contextos econômicos.
O autor conclui o capítulo apresentando um conjunto de possíveis diretrizes necessárias para a reformulação da teoria da organização:
- O homem tem diferentes tipos de necessidades, cuja satisfação requer múltiplos tipos de cenários sociais;
- O sistema de mercado só atende a limitadas necessidades humanas, e determina um tipo particular de cenário social em que se espera do indivíduo um comportamento consistente;
- Diferentes categorias de tempo e espaço vital correspondem a tipos diferentes de cenários organizacionais;
- Diferentes sistemas cognitivos pertencem a diferentes cenários organizacionais;
Diferentes cenários sociais requerem enclaves distintos, vínculos que os tornam inter-relacionados.
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Referência
RAMOS, Alberto Guerreiro. A nova ciência das organizações. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getúlio Vargas, 1989. Caps. 1, 2 e 6, p. 1-48 e 118-139.
Resumo confeccionado durante o programa de mestrado da UDESC/ESAG
Disciplina: Estudos Organizacionais
Professor: Dr. Mauricio C. Serafim